Leiria-Fátima

A prática dominical na diocese de Leiria-Fátima

Já é possível uma primeira apreciação dos dados do Recenseamento da prática dominical de 2001, em termos de variação relativamente aos dados de 1977 e 1991. Uma leitura mais completa terá que aguardar informações demográficas de carácter local, por idades e sexos, que o recente senso nacional disponibilizará por certo. De forma preliminar, podemos já destacar alguns aspectos.

1 - Em números absolutos, frequentaram a missa dominical 72.048 pessoas com sete e mais anos, aquando do recenseamento de 2001. Reportado aos recenseamentos anteriores, este dado traduz uma variação negativa de -9,1%, relativamente a 1991, que sucede a outra igualmente negativa, -7,7%, referente ao período anterior 1977-1991. Pode então falar-se de confirmação de uma tendência descendente, com certo agravamento: em apenas dez anos, ultimamente decorridos, a baixa foi maior que nos catorze anteriores. Mesmo assim, os dados diocesanos de 2001 indicam uma quebra inferior à média nacional, contrariamente ao que aconteceu em 1991.

2 – Em sentido oposto, o número de celebrações, todas eucarísticas, e de locais onde tiveram lugar, não cessaram de aumentar: descontando os dados referentes ao Santuário de Fátima, caso sempre peculiar, para menos participantes, houve um aumento de 5,3% nas missas, e de 3,3% nos locais. Também aqui se confirmou a tendência, neste caso positiva: em 1991, relativamente a 1977, as celebrações haviam subido 5% e os locais 10,6%.

3 – Embora aguardando correlações com elementos populacionais actualizados, podem caracterizar-se os “praticantes”, por idades e sexos.

A média de idades das assembleias tem aumentado progressivamente. Referenciando os grupos etários mais volumosos, em 1977, em 100 presentes, 24 situavam-se nos 7-14 anos, e 20 nos 40-54 anos. Em 1991, 23 estavam nos 55-69 anos, e 20 nos 40-45 anos. Em 2001, as posições relativas dos grupos mantêm-se mas o grupo etário 55-69 avoluma-se com 26%, embora o dos 40-54 desça ligeiramente para 19%. Significativa é também a evolução dos setenta e mais anos: de sextos e últimos, em 1977 e 1991, com 7% e 11%, respectivamente, passaram a terceiros, em 2001, com 17%. Abaixo dos 40 anos e para 100 presenças, contávamos 57 no primeiro recenseamento, 46 no seguinte, e tão somente 37 no último. A deslocação para idades mais avançadas nota-se igualmente quando se olha ao que se tem passado no interior de cada grupo etário. Dos 7 aos 14 anos e, sobretudo, dos 15 aos 24, verifica-se uma rarefacção que só começa a inverter-se entre os 55 e os 69 anos e se confirma notoriamente com os mais idosos.

Numa leitura por sexos, as mulheres são mais numerosas (63,8%). Entretanto, o aumento deste ascendente foi de 3,1% em 1991 e apenas 0,4% em 2001. Ao mesmo tempo, as variações, masculina e feminina, em 1991 e em 2001, denotam alguma discrepância de tendência: os homens desaceleram a descida de –12,4% para -10,4%, as mulheres aumentam-na de –6,3% para –8,5%. Isto é especialmente visível nos grupos mais jovens. Entre os 7-14 anos, para 100 presenças femininas em 1977, contam-se 68 em 1991 e 46 em 2001, enquanto para 100 homens em 1977, há 70 em 1991 e 49 em 2001. No grupo dos 15-25 anos, a “desfeminização” é ainda mais clara: de 100 mulheres em 1977, passa-se a 66 e depois a 42, enquanto de 100 homens se desce sucessivamente para 69 e 48. Tudo indica que a baixa da frequência da prática dominical que se tem acentuado nas idades baixas e médias, e tem sido preponderantemente masculina, se generaliza agora de forma idêntica ao mundo feminino.

4 – Outro elemento importante diz respeito às comunhões que, em absoluto, tiveram, em 2001, um aumento de 1,7%, efectivamente pequeno se comparado aos 55,5% de 1991. Contudo, há outro conspecto: em termos relativos, para 100 presentes, contaram-se 53 comungantes em 2001, 48 em 1991, e apenas 28 em 1977, índices que confirmam a grande evolução operada entre 1977 e 1991, traduzida em aumento tendencial da participação dos presentes na comunhão.

A leitura por sexos e a idade, só é possível em 1991 e 2201, dado que o recenseamento de 1977 não descriminou essas variáveis. Tanto em 1991 como em 2001, os homens comungam menos que as mulheres, em qualquer idade. Por outro lado, nos dois recenseamentos, os índices de comungantes no interior dos grupos etários de praticantes desenham uma curva côncava com os pontos mais altos nas extremidades, 7-14 anos e 70 e mais, e os mais baixos no grupo 25-39 anos, para o qual converge em descida de ambos os lados.

5- Os dados estatísticos interessam obviamente à actividade pastoral. Neste caso, parecem apontar para a necessidade de uma descoberta das verdadeiras motivações de uma prática que se vai desligando cada vez mais de normas e hábitos. A desproporção evidente entre os que se afirmam cristãos e católicos e os que se afeiçoam efectivamente à Eucaristia e à celebração do dia do Ressuscitado, coloca interrogações. Muito haverá a reflectir sobre a comunicação e absorção do núcleo fundamental da fé, sobre o modo de celebrar e fazer participar na celebração, de restabelecer pontes entre o momento celebrativo e a vida pessoal, eclesial e social.

A rarefacção da prática generalizada entre os adolescentes é talvez o fenómeno mais saliente. Tem que ser encarado em múltiplas vertentes e nunca isolado. Em primeiro lugar, parece indissociável da tendência para a ausência, que vem sendo notória e se vem prolongando no grupo etário 25-39 anos, onde se situam os pais? De seguida, não pode deixar de questionar-se o outro lado complementar da parceria educacional, a catequese antes de mais, pois que de formação cristã se trata, e a própria escola, no que toca a conteúdos e pedagogias, mas também a ligações e cooperação com a família e com a comunidade, e à inserção e confronto com a cultura envolvente.

A correlação negativa entre o movimento descendente da prática dominical o crescendo da participação na comunhão eucarística dos praticantes, necessita também de um olhar atento. Mesmo ao nível sociológico, há que fazer entrar mais variáveis que ajudem a perceber as motivações e os níveis de percepção dos gestos celebrativos, de modo a procurar esclarecer a dúvida subsistente entre uma participação de maior qualidade de e a banalização da comunhão. Critérios como o da coincidência entre fé e comportamento, moral dos cristãos e moral cristã, participação e empenhamento, poderão ser decisivos para uma maior clareza.

As direcção oposta em que seguem a diminuição das presenças e o aumento do número de missas, associada à crescente falta de presbíteros e à não substituição das celebrações eucarísticas por celebrações sem padre, deve também, no entender de muitos, fazer reflectir. Colocando de permeio, o retardamento da instituição do Diaconado permanente, há, pelo menos um adiar de soluções que não apenas influirá na capacidade de poucos terem que preparar bem muitas celebrações, mas também poderá, de um momento para o outro, vir a forçar uma resposta in extremis, sem se dispor dos meios necessários.

A leitura da realidade terá que continuar, lúcida e decididamente. Os recenseamentos regulares são meios que, devidamente aproveitados, podem ser úteis, sobretudo se associados e completados por outros tanto ou mais necessários.

Luís Inácio João
Diocese de Leiria-Fátima